Por motivos diferentes dos EUA, onda de desligamentos chega ao Brasil


01/09/2022
Por Phillipe Scerb – Mestre em Ciências Políticas pela SciencesPo-Paris e Doutorando pela USP

A chamada “grande renúncia” vem dominando o debate sobre o mercado de trabalho nos Estados Unidos nos últimos meses. Em mais um movimento provocado pela pandemia, milhões de trabalhadores americanos têm abandonado seus empregos voluntariamente.

Por aqui, os pedidos de demissão também têm batido recordes históricos, mas por razões diferentes. Nos Estados Unidos, os trabalhadores que estão deixando seus cargos têm ocupações, renda e qualificações diversas. Com as reconsiderações sobre o sentido, a dinâmica e as relações de trabalho trazidas pela Covid, de um lado, e os programas de proteção social criados pelo governo, de outro, muitos americanos estão revendo os rumos de suas carreiras.

No Brasil, os pedidos de demissão são igualmente expressivos. Entre janeiro e maio deste ano, 2,9 milhões de brasileiros pediram as contas – sem considerar as demissões de comum acordo entre empresa e funcionário. É um recorde e um aumento de 35% em relação ao mesmo período do ano passado.

No entanto, os profissionais que têm abandonado voluntariamente o emprego por aqui se concentram em um grupo específico. A maioria deles é composta de jovens e com maior qualificação do que a média dos brasileiros.

Chama a atenção, ainda, que os pedidos de demissão se destacam na área de tecnologia. Um levantamento de Firjan (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro) mostrou que, em 2022, 65% dos profissionais de informática se desligaram voluntariamente, à frente dos técnicos em informática (57%) como o subgrupo ocupacional com maior proporção de pedidos de demissão.

Entre os profissionais menos qualificados, os índices de demissão voluntária são muito menores. O mesmo estudo revelou que entre profissionais sem o ensino fundamental completo, uma em cada quatro demissões ocorre a pedido do funcionário. Entre os trabalhadores de nível superior, a mesma proporção é de 48%.

Nem poderia ser diferente para um país desigual como o Brasil, em que a demissão pode significar muitas vezes alta vulnerabilidade e até insegurança alimentar, cujos índices cresceram nos últimos anos.

De toda forma, o aumento do número de demissões é um fenômeno relevante. Ele indica, além do aquecimento do mercado de trabalho na área de tecnologia, a maior disposição dos jovens em rever suas trajetórias e abrir mão da estabilidade no trabalho por novos desafios e oportunidades. Uma mudança e tanto.

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