Por Eliane Franco Figueiredo – Diretora Projeto RH – Lider Inserção do Comitê Inserção de Refugiados do Grupo Mulheres do Brasil
Na última quinta-feira, 25 de junho, foi transmitida, pelo canal do Grupo Mulheres do Brasil no Youtube, a live “A Contribuição dos Refugiados para o Crescimento do Brasil
Aproveitamos a ocasião do Dia do Imigrante, comemorado nesta data, e do Dia Mundial do Refugiado, celebrado no último dia 20, para apresentar um pouco da realidade de pessoas nessas condições. Homens e mulheres que, por motivos como perseguição política e religiosa, conflitos civis e escassez econômica, são levados a deixar empregos, famílias, amigos e cultura para trás e recomeçar tudo em outro país.
Participaram da conversa, mulheres que vivem na pele, já há alguns anos, os desafios que imigrantes e refugiados encontram para reconstruir suas vidas no Brasil. E, também, mulheres que dedicam parte de seu tempo e de sua energia para acolher e integrar essas pessoas ao mercado de trabalho de nosso país e, assim, promover a sua inserção na sociedade.
Chieko Aoki, presidente do grupo hoteleiro Blue Tree e que conduziu junto com o Comitê de Inserção de Refugiados do Grupo Mulheres do Brasil um importante programa de capacitação para refugiadas no ano passado, contou um pouco sobre a história de sua família. Vindos do Japão, seus pais foram lavradores no interior de São Paulo e contaram com a ajuda de muitos brasileiros para iniciar sua trajetória por aqui.
A síria Gazhal Baranbo, que deixou seu país em 2012 em meio a uma guerra civil, também participou. Ela chegou a montar um restaurante e a empregar brasileiros em seu negócio. Mas sem conhecer quase ninguém por aqui e sem ter com quem deixar seus filhos pequenos, teve de fechar as portas. Seu marido, engenheiro formado, não conseguiu validar seu diploma e trabalha como Uber. Atualmente, os dois preparam e vendem comida árabe.
Na live, pudemos conhecer um pouco também da trajetória de Renée. Vinda da Guiana Inglesa, ela chegou em Manaus em 2011 sem falar uma palavra de português. Até hoje ela se lembra com carinho de uma vizinha que, apesar dos limites da comunicação, lhe ajudou muito no período inicial de adaptação à língua e ao país que ela acabara de conhecer.
Renée contou que, depois de um curso para a confecção de bonecas, começou a trabalhar com isso. Mas logo percebeu que faria mais sentido fazer bonecas negras, mais afeitas às suas origens e a parte negligenciada da cultura brasileira.
A experiência tanto de Ghazal quanto de Renée mostram que, embora tenham que enfrentar grandes desafios para reconstruir suas vidas, imigrantes e refugiados contribuem para o desenvolvimento econômico e cultural dos países de destino. E no Brasil não é diferente.
Elas reconhecem a importância de poder contar com os mesmos direitos dos brasileiros no acesso a serviços públicos como saúde e educação. Mas reforçam que, assim como qualquer outro cidadão, consomem, trabalham e pagam impostos.
Chieko ainda reforçou que pessoas que tiveram que abandonar seu país de origem tendem a se destacar pela resiliência. Aprender um novo ofício, por exemplo, é tarefa simples para quem enfrenta o desafio de recomeçar do zero. Nem sequer aqueles mais qualificados, que contam com ensino superior, têm vida fácil. Pois têm de lidar com um processo que costuma ser burocrático, caro e lento para obter o reconhecimento de seus diplomas e, na maioria vezes, essa tentativa não tem êxito.
Discutimos também como a crise imposta pelo Coronavírus tem sido dura para os refugiados. Em um relatório publicado pela Acnur no mês de junho, três questões são apontadas como principais motivos de preocupação: a crise sanitária, que atinge sobretudo aqueles em condição de vulnerabilidade; a crise econômica, especialmente prejudicial aos trabalhadores sem vínculos formais; e a crise de proteção provocada pelo fechamento de fronteiras, já que refugiados encontram agora mais dificuldade para regularizar sua situação.
No Brasil, eles têm sofrido principalmente com o segundo ponto levantado acima. Na medida em que a maioria dos imigrantes e refugiados atua no mercado informal, muitas vezes como camelôs e vendedores ambulantes, sua principal fonte de renda desapareceu com a pandemia.
Nesse sentido, tivemos que adaptar as ações do nosso Comitê. Com atividades voltadas especialmente para a capacitação e a empregabilidade, tivemos que fazer um parênteses nesse período e deslocar nossos esforços para a doação de alimentos e produtos de higiene. Afinal, sem renda, as pessoas têm se deparado com as necessidades mais básicas.
Gazhal, por exemplo, contou que boa parte de sua demanda provinha de eventos. Assim, passou a fazer delivery de alimentos. E, com a crise, apesar das dificuldades, passou a fazer comida para pessoas com mais de 65 anos que não podem sair de casa. Depois, foi contratada pela ONG Estou Refugiado, representada na live por sua Diretora Executiva, Luciana Capobianco, para preparar marmitas para refugiados africanos em São Paulo, o que foi de grande ajuda para sua sobrevivência, além de contribuir para a sobrevivência de outros refugiados.
Juliana Algodoal , que também lidera o Comitê, comentou que os projetos de capacitação profissional destinados à inserção de refugiados no mercado de trabalho estão em segundo plano atualmente. Preparar essas pessoas e ajudá-las a encontrar emprego continua sendo fundamental, mas, neste momento, a prioridade é garantir meios mínimos de sobrevivência.
Renée, por sua vez, está conseguindo vender poucas bonecas e, portanto, passou a confeccionar máscaras contra o Coronavírus. Muitas delas, aliás, com tecidos africanos. E mesmo que essa tenha se tornado sua principal fonte de renda, ela doa parte das máscaras a pessoas que não podem pagar por elas. Para Renée, numa fala que foi reforçado por Chieko, nós temos duas mãos: uma para dar e outra para receber.
Era justamente essa a mensagem que queríamos passar nessa live. Uma mensagem de solidariedade e acolhimento a pessoas que não reivindicam nenhum privilégio, apenas a oportunidade de construir suas vidas longe das dificuldades que as trouxeram até aqui.